segunda-feira, 11 de julho de 2016

E o teu olhar daltônico
não aceita a cor do relvado
que vibra tanto vermelho,
em tons de vermelho,
gritantes.

Mudamos para Bad Ischl
e aquele rio
e as águas daquele rio ficam
entorpecendo os nossos ouvidos
com as miniorquestras
que se movem ao sabor dos doces
em cada café
de cada esquina.

E tudo é alto,
tudo é azul.
Os olhares, o céu,
o rio.
Fica monótono.

E o teu olhar daltônico
não aceita ver a neve
nos picos que sobem
e se mostram fálicos.

Mudamos para a Grécia
e o teu olhar daltônico
não aprecia a sujeira
daquela Atenas
que tão somente apenas
desgraça aquele berço.

Mudamos para o Mar Egeu
e o teu olhar daltônico
não nada,
não mergulha,
não se entrega.

Quer só areia,
quer só sol,
quer só ficar em terra.

Enterra.

E tudo vamos de trem,
de carro, de ônibus,
a pé.
Porque o teu olhar daltônico
não voa,
não perdoa.

Se prende, é fixo,
é triste.

Omite os parágrafos escritos
pelo caminho.

O teu olhar daltônico acha
que tudo é fate.

Eu olho para ti
e talvez sejas fake.

Mas eu sigo ao teu lado.
Meu corpo tão acostumado
já te pertence.

O teu olhar daltônico
me encanta
porque sinto tua mão
espalmada
contra a incertezas da vida,
e isso me acalma.

Mas você
não me alimenta
a alma;
você transfere,
você não vive; sobrevive,
porque o teu olhar daltônico
não fere.

Ele só navega, assim,
pacífico, lânguido,
despojado.

Como que não se importasse
porque sabe que é amado.

Mas disso que recebe
não retribui.

Talvez,
porque o teu
olhar daltônico
te obstrui.

E mudamos para Shangri-la
num horizonte perdido
de Hilton.

Onde a única coisa
que eu quero
é descascar tua pele
e colocar para secar.

Ficar com aquele sabor
fumado,
ressecado.

Para ver se o teu
olhar daltônico
se anima.

Para ver se você,
finalmente,
pode olhar,
não de cima,
mas igual.

Para ver se o teu
olhar daltônico
finalmente
pode virar
monocromático
e animal.

Mas não,
esquece,
deixa como está.

Fica assim.

Quem sabe, teu
olhar daltônico,
se eu me vestir,
se eu me pintar,
se eu me ferir
de verde,
repara em mim.

Quem sabe,
se eu me tingir
de vermelho,
o teu olhar daltônico
repara em ti.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

FC apud VC, Season 1, Episode 2

Mordo teu queixo. Olho para a tua boca e me releio,
reencontro meu nome, over and over, e me incandesce.

Ao fundo aquele jazz embala nossos devaneios,
porque nossa pele lá se funde, enquanto cresce.

Expande.

Seus joelhos ecoam pelos lençóis que, úmidos, se sentem afogados, molhados
do nosso humor, e vítreo, quando nosso olhar se cruza, inflamado, calado.

A parede fecha os olhos; se avexa na nudez dos nossos membros laicos
que se entrelaçam como gatos insaciados, tunantes, erráticos.

Respira.

O teto tem braços que berram ao sentir a névoa que sobe do nosso sexo trincado, 
enlevado pelas juras de amor ritmadas lançadas ao sabor do nosso percurso extasiado.

O guarda-fatos (o armário, o closet) se entreabre, como meus lábios ciliciados 
pelo teu falo que (en)canta, rabisca e rebusca em nós gozo cíclico, continuado.

Serena.

A estante medrosa tampa os ouvidos aos objetos que, antes inanimados, agora, em queixume
semicerram os olhos a tentar ficar incólumes ao vislumbrar nosso embate em volume.

A porta segura o batente ao ouvir da escada o relato de passos e, desesperada,
tenta se fechar, traumatizada, ao realizar o girar da chave na sua igual na entrada.

Risos.

Tudo silencia. 
Os lençóis se amanham.
A parede, cansada, reverencia.
O teto derruba os braços lentamente, acintura.
O closet afinal relaxa e não se incomoda na abertura.
A estante observa seus itens, garante o bem-estabilizar.
A porta, batida, fechada à pancada, quebrantada, ofendida
começa a experimentar pulsação da parede, pelo batente, transmitida,
reverberada pelos alto-falantes em cima da mesa, em madeira polida.

Por que a mesa nada de desejo ou cobiça expressou?
Receio?

Não.

Por que o jazz, que por cima (lhe) tocava, embalou;
e ela, extática, veio.

Retoma...